quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

Se você não se cuidar, a teletela vai lhe pegar...

"Se você quer uma imagem do futuro,
imagine uma bota prensando
um rosto humano para sempre."
(George Orwell)
A Rede Golbo traz de volta o execrável programa Big Brother Brasil. Um espetáculo vulgar, grosseiro em sua mais íntima essência, deplorável sob todos os aspectos, mobilizará com certeza milhões de telespectadores, alguns dos quais serão chamados, nas ruas, a "opinar" a respeito do que estarão fazendo os personagens integrantes da farsa midiatizada.
Claro, é importantíssimo saber se algum sujeito vai ou não fazer-não-sei-o-quê, ou se alguma das doidivanas do programa fará não-sei-mais-o-quê-lá. Claro. Im-por-tan-tis-si-mo! Claro, o Brasil precisa de idiotas.
É o seguinte: trata-se, na verdade, de um grupo, melhor diria, de um magote de indivíduos que se prestará a qualquer tipo de comportamento. Tudo, a troco de ganhar um milhão de reais. Esse tipo de produção, que é uma espécie de franchising, foi criada por um holandês que fez fortuna programando o Big Brother e outras armações do tipo. Na verdade, é apenas uma atitude de marketing, onde a emissora fatura fábulas e todo um país, qualquer país, fica como que fascinado com o medíocre e com o torpe, o tolo e o boquirroto. Ser estúpido ganha aplauso.
Quando o escritor inglês George Orwell escreveu, em 1939, o livro 1984, queria representar uma sociedade totalitária, regida por um Big Brother, um Grande Irmão, que de tudo tomava conhecimento. E o fazia através de aparelhos televisivos, as "teletelas", que tanto transmitiam interminavelmente mensagens favoráveis ao seu governo, quanto, ao mesmo tempo, veja só, acompanhava o que você fazia em sua casa. Era, em intenção, uma crítica ao comunismo stalinista.
E, no livro, por toda parte estava o peso da mão do Estado. Jogo pesado: poder acompanhar o cidadão até mesmo na aparente segurança do lar; ver, saber o que ele fazia e assim determinar o que esse indivíduo faria. Claro, o medo presidia todo o processo.
Orwell jamais imaginaria que, de alguma forma, os televisores virariam mesmo teletelas. Enquanto nós vemos os farsantes do BBB obrarem seus grotescos gestos, emitirem seus toscos conceitos, de alguma forma perversa a Rede Globo também nos observa. A emissora monitora, minuto a minuto, em tempo real, como estão os índices de audiência de sua programação. Há toda uma aparelhagem tecnológica que permite esse acompanhamento.
E, à medida que tal situação se configura, o Grande Irmão está ou não, de alguma forma, vendo o que você faz? As pessoas não estão sendo manipuladas, idiotizadas pela Rede Globo, da mesma forma que no livro 1984? Só que de forma sutil. Disfarçadíssima. Você não vai preso, não é processado, não é procurado... Mas pode acabar comprando alguma bugiganga que a publicidade global mandar...
Mais que isso, a Globo vende você. É, a Globo vende você aos anunciantes. Exibe números exorbitantes de audiência e cobra milhares de reais por 30 segundos de um comercial. Quem estiver sintonizado, estará vendido. Coitado, o sujeito vendo TV, sem saber que acabou de virar mercadoria. É, é isso: televisão não vende produto. Xampu, carro, roupa, etc..., nada disso. Televisão vende gente. Televisão vende gente aos grandes anunciantes.
É bem verdade que o personagen principal de 1984, Winston Smith, tentou libertar-se do Estado e de seus poderes tentaculares. Acabou preso, sofreu uma lavagem cerebral e tornou-se novamente um servo fiel do totalitarismo.
Claro que a Globo não é o Estado, nem vai prender ninguém, se esse alguém deixar o BBB por outro programa. Sabe por quê? Porque a Globo sabe que depois você volta a sintonizar. A verdade é que dá pena, raiva, revolta, vendo esse povo tão sofrido e traído, mal assalariado e sem escola, sem saúde ou segurança, discutindo com veemência se algum ser obtuso e ganancioso deve ou não ser eliminado do programa. O negócio é o seguinte: parece que o povo não percebe, mas quem foi eliminado - foi o povo.

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