O direito de ser bandido e
o doce
charme das elites
Por Emanoel Barreto
A violência no Brasil é sistêmica, complexa e,
pela forma como se apresenta - organizada e enraizada-, dificilmente será
vencida.
Vejamos: é preciso entender que a
violência está dentro dos presídios mas mantém firme conexão com os atos
criminosos que se dão fora deles, inter-influenciando-se mutuamente.
Além disso, as causas históricas do
fenômeno criminal permanecem inalteradas secularmente, num perverso processo de
marginalização que leva muitos à prática de delitos como se aquela fosse forma
aceitável de viver.
As causas históricas manifestam-se
nos baixos salários pagos pela iniciativa privada – e no seu inverso: os
segmentos estamentais eternizados em situação privilegiada: régias remunerações
contemplam o judiciário, a alta oficialidade das forças armadas, políticos
profissionais e setores do funcionalismo público.
Junte-se a tal fato a corrupção perpetrada
pelo alto empresariado junto a agentes públicos – agregando-se a isso a
sonegação de impostos – e temos a receita social perfeita e o caldo de cultura
exato a propiciar o encaminhamento do indivíduo socialmente desvalido ao crime.
Com o Estado aparelhado e
tornado meio de vida para os privilegiados, todo o dinheiro que deveria
estar ao dispor da sociedade vai parar em poucas contas bancárias.
Simplificando: falta dinheiro para as funções sociais da instituição estatal.
E muitos jovens que vivem um
cotidiano de privações e fome compreendem-se como membros de alguma forma de
sociedade marginal e passam a vivenciá-la. Entendem-se como se tivessem o
“direito” de ser criminosos.
Ou seja: nas favelas e arrabaldes
esse tipo de pensamento passa a ser compartilhado, torna-se um valor, uma
espécie de crença, uma maneira de experienciar a existência e uma forma de ser
no mundo.
Então, imbuído de tais princípios, o
indivíduo passa a cometer atrocidades com grande desenvoltura e sem qualquer
senso de culpa. Torna-se convicto. Mata e agride com a mesma naturalidade que
um trabalhador ergue uma parede ou pega um ônibus de volta à casa. É o
“direito” de ser criminoso.
Entre os criminosos e os
privilegiados há um abismo profundo. As elites não estão dispostas a ceder seus
privilégios; os bandidos reagem e buscam espaço. E o resultado é o que
temos: presídios explodindo, o terror batendo à sua porta. Mas as elites,
protegidas, sabem o que são: as elites protegidas.
O Estado não tem como garantir ao
trabalhador integridade física, bem-estar, sossego, tranquilidade, saúde,
educação, cultura, transporte, dignidade.
Também não consegue ser eficaz na
busca de levar adiante ações repressivo-preventivas para enfrentar aqueles que
estão no caminho do crime, ofendendo os que trabalham.
E chegamos ao atual ponto: uma situação
insustentável, especialmente pelo fato de que os criminosos já vivem seu
sentimento de pertença a um grupo e entendem a sociedade como sua presa
legítima.
Caso não haja uma profunda revisão de
valores, caso os dinheiros públicos não venham a ter devida aplicação ;e
mantendo-se – como serão mantidos– os privilégios e a corrupção, a tendência do
quadro é de constante agravamento.
O “direito de ser criminoso” crescerá, e os
bandidos, identitários e armados, continuarão a disseminar a violência e a
morte. E as elites continuarão em seus castelos, protegidas e felizes.
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