quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Vejo na Folha e compartilho


Cópia fiel?

Versão da 'Mona Lisa' descoberta no acervo do Museu do Prado, em Madri, segue à risca processo de criação de Leonardo Da Vinci, mas não atinge efeito luminoso da tela original
SILAS MARTÍ
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

A versão da "Mona Lisa" apresentada ontem pelo Museu do Prado, em Madri
Pintura descoberta da Mona Lisa
Foi como abrir uma janela que ficou fechada por mais de dois séculos. Técnicos do Museu do Prado, em Madri, definiram dessa forma o estudo que fizeram sobre a cópia da "Mona Lisa" descoberta no acervo da instituição. Dominique Faget/France Presse
No caso, a janela que dava para a paisagem atrás dessa versão da Gioconda, coberta por uma camada de tinta preta cerca de 200 anos depois da conclusão da tela.
Um mês depois do anúncio de que a cópia do Prado não era uma imitação posterior e sim uma espécie de fotocópia da original de Da Vinci, pintada em paralelo à tela em seu próprio ateliê, o museu espanhol apresentou ontem o quadro à imprensa.
Num primeiro momento, antes de saber se seria possível remover a camada de tinta que cobria a paisagem no fundo do quadro, restauradores do Prado compararam exames infravermelhos da cópia e da original, numa técnica em que a luz nessa frequência é absorvida e depois refletida pelos pigmentos negros abaixo da pintura.
A obra aurática

É como se o desenho preparatório saltasse à superfície, levando à descoberta anunciada ontem com estardalhaço de que cada traço da obra original havia sido reproduzido, mesmo em fase de estudos, na cópia que arrastou uma multidão ontem ao Prado ao ser exposta pela primeira vez após o restauro.
"Notamos que as linhas que estão debaixo do original se repetem na cópia", diz Ana González Mozo, restauradora que coordenou os estudos. "Isso revela as mudanças de ideia e hesitações de Da Vinci quando pintou."

No caso, o mestre italiano chegou a alterar o contorno da cintura da modelo, a posição dos dedos, o desenho do véu e a altura da cabeça, além de traços no rosto e no pescoço. Tudo isso também aparece alterado na cópia.

Depois que radiografias comprovaram a existência de uma pintura por trás do fundo negro da imitação, restauradores desbastaram essa camada superficial num processo que durou meses.

"Fomos abrindo várias janelas na pintura, para ter certeza de que não havia pedaços danificados pelas alterações posteriores", explicou Almudena Sánchez Martín, restauradora que removeu a camada de tinta. "A fase mais delicada foi abrir a pintura perto do contorno do rosto, que precisava ser integrado de volta à paisagem."

Atrás, estava um pano de fundo quase idêntico à paisagem toscana do original, com a diferença de duas montanhas que aparecem à direita do quadro, na altura dos olhos da Gioconda.

Da Vinci não chegou a pintar as colinas, mas fez um esboço delas num papel separado, um desenho datado de 1508, que só podia ter sido visto em seu ateliê enquanto ele pintava a "Mona Lisa", iniciada em 1503.
Esse dado descarta algumas hipóteses sobre a autoria do quadro, já que alguns nomes cogitados por especialistas não teriam tido contato com esse desenho na data em que a cópia foi feita.

Embora a composição seja idêntica à original, com as mesmas dimensões pictóricas, especialistas concordam que o pintor da cópia não tentou emular o famoso efeito sfumato, técnica de pincelada de Da Vinci que criava uma espécie de aura difusa.

"Nossa cópia não tem nada a ver com a técnica de Leonardo", diz Miguel Falomir Faus, chefe de pintura italiana do Prado, à Folha. "Ela foi feita de modo caligráfico, preciso. Ele fez até as sobrancelhas da Gioconda, que não estão no original."

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