quarta-feira, 7 de julho de 2010


O icosaedro truncado é proporcional ao momento estático, que por sua vez é algo que se parece com o iconoclasta madrileno do escambo
Emanoel Barreto

A Folha de S. Paulo tem em sua política editorial a proposta de manipulação do leitor mediante o recurso que lá eles chamam de amor/ódio. Quem bem explica - e apoia o método - é o professor Carlos Eduardo Lins da Silva em seu livro "Mil dias, seis mil dias depois". Segundo entende, é preciso agredir o leitor a fim de provocar nele a necessidade de ler o jornal. O confronto jornal/leitor, afirma, é proveitoso em termos políticos e de mercado.

Diz assim: a relação amor/ódio "em todos os sentidos, trata-se de uma postura que só pode ser positiva em termos tanto de mercado como de influência política. Um  veículo de comunicação que seja apenas benquisto pela sua audiência, acaba se tornando desinteressante, monótono, previsível. A relação amor/ódio é muito mais provocante, recompensadora e condizente com um público sofisticado e crítico."

Mais claro que isso só o Satânico Dr. No. Pois bem: o artigo abaixo certamente está inscrito nessa política editorial. É uma verdadeira afronta a qualquer concepção de jornalismo. O articulista, um matemático, se expressa em linguagem acadêmica e, como tal, esotérica. Não fez qualquer esforço para explicar ao leitor não-iniciado em sua ciência o que seja a tal bola Jabulani, a suposta intenção do artigo.
Com você, um pingo do ódio que a Folha destina ao leitorado. Na íntegra, o samba do crioulo doido.

Jabulani, a bola mais criticada
JOSÉ LUIZ PASTORE MELLO jlpmello@uol.com.br


O poliedro de material flexível inflável da Jabulani só é composto por pentágonos regulares


NINGUÉM RECEBEU mais críticas durante a Copa do Mundo de futebol do que Jabulani, a bola oficial do torneio. Ela foi chamada pelos jogadores de "bola de supermercado" (Julio César), "bola sobrenatural" (Luis Fabiano) e até de "bola patricinha" (Felipe Melo).


A história moderna da bola de futebol remonta à Copa de 70, ocasião em que o mundo foi apresentado a uma bola de futebol cuja forma se mostrou tão conveniente que permaneceu em uso até o recente aparecimento da Jabulani.


A concepção da bola consagrada em 70 foi inspirada em um conhecido poliedro convexo, descoberto por Arquimedes, denominado de icosaedro truncado. O icosaedro regular é um poliedro convexo de 20 faces triangulares, e o icosaedro truncado, um poliedro convexo obtido após fazermos "cortes" nos vértices do icosaedro regular.


Por serem poliedros, tanto o icosaedro regular como o truncado atendem à seguinte relação, conhecida como teorema de Euler: o número de vértices (V) mais o de faces (F) excede em 2 a quantidade de arestas (A), ou seja, V+F = A+2.


No caso do icosaedro regular, suas 20 faces são triângulos equiláteros, sendo que cada vértice do sólido é formado pela junção de quatro triângulos, o que concede a ele 12 vértices e 30 arestas. As 32 faces do icosaedro truncado são formadas por 12 pentágonos regulares e 20 hexágonos regulares. Cada um dos 60 vértices do icosaedro truncado é formado pela junção de 1 pentágono e 2 hexágonos, o que resulta ao sólido o total de 90 arestas. Poliedros cujas faces regulares são de mais de um tipo, como o icosaedro truncado, que possui faces pentagonais e hexagonais, recebem o nome de sólidos de Arquimedes.


Desde os anos 70, portanto, a fabricação da bola tradicional de futebol é feita inflando-se um icosaedro truncado de faces flexíveis até se obter um sólido "suavemente" esférico. A novidade introduzida pela Jabulani é o fato de que o poliedro de material flexível inflável nela utilizado é composto apenas por pentágonos regulares, como se vê no vídeo da sua fabricação.


Para entendermos por que uma bola como a Jabulani implica uma trajetória mais irregular do que a da bola tradicional, é razoável olhar para a planificação das faces a partir de um dos vértices do poliedro e compará-la com a da bola tradicional.


Observe que o "ângulo de folga" com relação a 360 é menor na bola tradicional do que na Jabulani, o que, em última análise, implica dizer que, quando inflada, a bola clássica irá gerar uma superfície mais suave -e menos suscetível à trajetória irregular- do que a Jabulani.


Não só nossos jogadores estão "matematicamente" corretos em reclamar da Jabulani, como também podemos dar um novo apelido a ela: Jabulani, a "bola não arquimediana". 
(JOSÉ LUIZ PASTORE MELLO é graduado e mestre pela USP e professor de matemática do Colégio Santa Cruz)



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