quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Um samba acabado

Caros Amigos,
Folheando as páginas da net vi, acho que ontem ou anteontem, uma coisa de jornal que deixou-me perplexo: um casal madrileno saiu à noite com um filho de poucos meses, deixou o carrinho do bebê numa esquina e foi, tranqüilamente, a uma boate. Após cinco horas marido e mulher chegaram a casa completamente embriagados e sem a criança.

Outro filho, de cerca de oito anos, entrou em pânico ao ver os pais naquele estado, já de madrugada, e sem o bebê, e teve a iniciativa e ligar para a polícia. O carrinho foi encontrado a cerca de 15 minutos da casa, os pais foram presos e liberados sob fiança e a criança vítima dos maus tratos foi levada a uma instituição que cuida de menores.

Sei que esse é um caso extremo de negligência paternal, como também o são os acontecimentos em que pessoas deixam recém-nascidos jogados no lixo e estes são quase que miraculosamente resgatados por passantes.

Os filhos, para essas pessoas, especialmente quando me refiro a famílias de classe média, como parece ser o caso do casal espanhol, podem passar a ser um estorvo. Entra em ação, aí, um mecanismo perverso de "vamos nos livrar do estorvo" e para tanto vale tudo: deixar crianças presas em casa, sozinhas, enquanto os pais se divertem, pedir a um vizinho para "dar uma olhadinha" e o que mais lhes der na telha.

O que impressiona é a banalização das relações familiares, quando pais e filhos, envoltos num processo de vida que esgarça os laços tradicionais de afetividade, tornam-se quase que desconhecidos uns dos outros. Os pais com uma vida que lhes é bastante própria e os filhos, encastelados em seus próprios aposentos, voltam-se mais para o computador e o MSN ou Orkut, ligando-se a comunidades virtuais.

Sei que isso é próprio dos tempos que vivemos, quando valores se emboloram e são substituídos por outros códigos de comportamento e relacionamento. Tal situação foi naturalizada e crianças e jovens passam a ser, para muitos pais, apenas um problema a ser resolvido da maneira mais fácil: dar-lhes um instrumento de diversão, no caso o computador, ou dinheiro para que também vão para a rua. Todos vivem um clima de festa, cujo final é sempre o mesmo: a família vira um samba acabado.
Emanoel Barreto

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