terça-feira, 1 de agosto de 2006

O espetáculo eleitoral

"Os políticos morrem de inveja
da gente. Eles se estapeiam para
aparecer no vídeo. enquanto nós
aparecemos todos os dias."
Da atriz Suzana Vieira

A coluna de Roberto Pompeu de Toledo, na Veja desta semana, está dizendo que a Globo negociou com os candidatos Luciano Bivar e José Maria Eymael a cobertura diária de suas andanças pelo país, comendo sanduíches de mortadela e bebendo café em botecos de segunda. Em troca, eles não serão excluídos de programas de debate ou entrevistas.

Assim, eles aparecem todos os dias no Jornal Nacional da mesma forma que personalidades como o presidente Lula, a senadora Heloísa Helena e o senador Cristovam Buarque, aparentemente como se estivessem em pé de igualdade. Insistindo no detalhe: o acordo com a Globo, segundo Pomeu, prevê que serão descartados nos grandes momentos da campanha, debates e entrevistas de peso. Relação custo/benefício para os dois: como certamente eles sequer se imaginam com competência para chegar a um segundo turno, é um grande negócio.

No caso, temos o que os estudiosos de comunicação chamam de enquadramento plural fechado. Explicando, mesmo que de modo simplificado, nesse enquadramento, ou seja nessa exibição dos atores políticos, todos os candidatos aparecem no noticiário, mas alguns estão em posição de assimetria sobre os demais, recebendo o realce que presuntivamente merecem, em função de posições ocupadas, histórico pessoal, passado político, essas coisas que dão fama reiterada às pessoas.

Quem não tem tais qualidades, fica em situação desprivilegiada. Lula e Cia. aparecem no notidiário de toda noite e vão participar dos debates: os outros dois, não. Eis aí o enquadramento plural fechado.

Na verdade, o foco deste comentário não é tratar de assuntos técnico-acadêmicos, como a questão dos enquadramentos. Mas trazer como tema o problema do espetáculo na política.

O que a globo não quer é a presença de atores de segundo time, cujas posições e pensamentos entende que não sejam do interesse popular. Ambos são ilustres desconhecidos para o povo, conseqüentemente, supõe-se que suas palavras não tenham interesse para o grande coletivo nacional.

O que se quer é provocar uma sensação, uma expectativa para as arenas a serem montadas pela Globo, presentes, aí sim, os nomes tidos como mais representativos. O que se quer mostrar é o embate, o conflito de forças máximas da política brasileira, as fagulhas comunicacionais que possivelmente sairão desse confonto. É o frisson, a mise-en-scene retórico-gestual.

E, dia seguinte, pesquisas vão pulular anunciando quem venceu o debate, quem convenceu mais, quem dobrou o adversário. Agora, quer ver Eymael ou Bivar aparecerem com destaque? Basta que surja fato novo, que jornalisticamente justifique sua presença com luzes e toques.

Caso eles consigam levar para as ruas, para onde quer quer estejam, o espetáculo, pronto, estarão aptos a se apresentar nos palcos da globo. E isso é o mais preocupante: a ação jornalística, caso sejam verídicas a informação do colunista de Veja, de que uma emissora de TV selecionou seus atores políticos segundo sua fama e suas divergências, ao invés de seus conteúdos. É uma seleção fulanizada.

Não estou dizendo que Eymael ou Bivar tenham nada de novo a propor. Apenas que deveria haver oportunidades iguais para aqueles igualmente candidatos. Só isso.

Na verdade, a prática da discriminação é comum. Somente surge em destaque no noticiário aquele que já detém capital simbólico acumulado durante muitos anos e portanto pode valorizar-se e ser valorizado pelo jornalismo.

Caso típico a quebrar essa regra foi o de Miguel Mossoró, aqui em Natal, quando, na última campanha para eleição de prefeito, se propôs a construir uma ponte ligando o Estado à ilha de Fernando de Noronha. Pronto: foi o suficiente para que seu perfil se enquadrasse nos critérios de noticiabilidade e o homem percorreu o mundo inteiro nos noticiários, blogs, comentários, tudo o que pudesse servir de veículo de comunicação de massa.

Quem sabe, se Eymael ou Bivar começarem a comer sanduíches gigantescos, pesando quilos e quilos, não consigam ganhar as manchetes e venham a ser convidados para debates?

Debates deveriam servir para esclarecer. Mesmo sabendo-se que no fundo são todos acontecimentos espetaculares em essência, uma vez que são acontecimentos de massa, deveriam ter um Norte ético, o que começaria com o convite a todos os candidatos.

Enquanto isso, o noticiário enche linguiça com o relato de visitinhas de candidatos, todos, a ruas e quitandas e o eleitor fica sem a informação principal: a visão de cada um, sua interpretação da realidade nacional e seus (supostos) compromissos.

A lei eleitoral contribui muito para amordaçar o noticiário televisivo. Mas a TV negociar o silêncio de alguém, aí já é outra coisa.

Um comentário:

Anônimo disse...

Concordo plaenamente.