sexta-feira, 19 de maio de 2006

Vamos fazer pesquisa de lata?

"Há duas maneiras de viver a vida: uma, é como se nada fosse milagre. A outra, com se tudo fosse milagre." Albert Einstein

Aprendo muito com a minha netinha, Eduarda. Certo dia, ela me ensinou: - Vô, é proibido prender arara em casa, sabia? Eu ensaiei uma cara de surpresa e disse: - É mesmo, Eduarda? E por quê?"

Ela me respondeu de forma bem direta: - É contra a lei. Não se pode prender arara, porque é contra a lei. A conversa continuou: -E o que é "contra a lei"? A resposta foi um primor de doce ingenuidade e, paradoxalmente, de grande pertinência. Veja só: - Vô, contra a lei é contra a lei, ora. Contra a lei, Vô: polícia!..

Ou seja, com seu raciocínio de criança de seis anos de idade, ela sintetizou a coercitividade social quando objetiva a que os cidadãos se adequem às determinações legais. Se é contra a lei, polícia neles.

Claro, simples como respirar. Assim, estava explicado por ela, para mim, o conceito de ilegalidade. E as araras, coitadinhas, supostamente protegidas por esse inocente conceito, que aparentemente faria tremer malfeitores de todo o tipo, caso aplicado em sentido amplo.
Claro que eu me comprometi com ela, e estou cumprindo: jamais prender uma arara. Ontem ela me ligou, com uma estranha convocação. Ela sabe que participo de todas as suas convocações. Era o seguinte: - Vô, você sabe fazer pesquisa de lata?


Eu quase caí: como jornalista, já fiz quase todo tipo de cobertura, passei uma noite inteira observando o hotel onde o Papa João Paulo II passou a noite em Natal, pois o jornal onde eu trabalhava temia que ele sofresse um atentado; estive numa mesma sala que que se encontrava Yasser Arafat; recebi uma visita da repressão do regime de 64 em minha casa e por aí vai. Mas, pesquisa de lata... que me lembre, jamais fiz.

Mas, como bom repórter, topei o desafio. "Pronto", pensei, vou fazer uma pesquisa de lata." Por precaução, perguntei o que era a tal pesquisa. Ela não soube me explicar, mas pediu que eu fosse à tarde em sua casa, para ver o que eu poderia fazer. Aceitei na hora. Já pensou, fazer uma pesquisa de lata com a minha netinha? O menino que ainda mora em mim ficou muito contente pelo convite.

Mas, pouco depois minha filha, mãe de Eduarda, ligou explicando que era preciso apenas uma latinha, para que ela fizesse uma experiencia escolar. Coisa simples e que ela mesma faria. Fiquei um pouco frustrado, mas mãe e filha precisavam sair naquela mesma tarde e minha pesquisa de lata ficará para outra oportunidade.

Tudo isso, além da alegria de falar sobre minha neta, serve também para uma reflexão: acho que o brasileiro precisa entender que há mais coisas contra a lei além de capturar araras. Vejamos: receber dinheiros desviados de fundos públicos, praticar assaltos, latrocínios, enganar o povo com discursos populistas, conviver com a improbidade, governos negociando e fazeendo concessões a bandidos, etc... etc...etc... Coisas que o brasileiro sabe muito bem.
Há, evidentemente, muitas coisas que são contra a lei. E se alguém ainda não memorizou o que é ser contra a lei, repito: - Vô, contra a lei é contra a lei, ora. Contra a lei, Vô: polícia!...

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