sábado, 8 de agosto de 2020


Brasil, há algo de podre neste reino da desgraça

Por Emanoel Barreto

O sol chama à praia, o bar convida ao chopp, a academia diz que ali tudo é saúde, os parques nem se fala e os shoppings são uma maravilha: alegria pura, vitória do consumo, momentos radiantes de futilidade, instantes de intensa, radiosa, solar e estúpida alegria. É como se em meio à tormenta da pandemia vivêssemos a sagração da primavera.

Comemoramos em epifania nojenta a nuvem suja e invisível que nos cerca e caminhamos contra o vento sem senso nem sentimento, sem pudor, desrespeitosos. 

Em alguma medida nos transformamos em um grande campo de concentração ao ar livre, numa festa desprimorosa que em alguma medida comemora a morte dos cem mil. Mas, esteja certo e confiante: ainda é possível matar mais – basta reabrir as escolas para dar início ao massacre dos inocentes. 

Eia, pessoal! Adiante! Vamos levar as crianças à escola. Só quero saber quem será o Herodes do Rio Grande do Norte. 

As  crianças podem morrer de Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica, que acomete crianças e adolescentes de zero a 19 anos, e que pode estar ligada à covid-19, li isso em matéria na Tribuna do Norte há uns três dias.

Mas, fora isso é festa; o grande campo de concentração é florido. O Brasil é um país de cores lindas e nem precisamos de ordem de prisão para seguir em direção ao abismo: estamos de braços dados com o fosso – amigos íntimos, irmãos, camaradas.

Pessoas morrem literalmente aos montes, mas os demais são como passantes; imunes, levianos. Embebidos de um deleite troncho e insensível querem diversão e fuga. 

Há algo de monstruoso nessa forma de existirmos enquanto nação. Há algo de imundo nas decisões de vivermos essa falsa normalidade, cavilosa hipocrisia de convivermos com aquilo que pode no matar. 

Há algo de podre neste reino da desgraça. Há algo de podre na pátria amada Brasil.

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