Brasil, há algo de podre neste
reino da desgraça
Por Emanoel Barreto
O sol chama à praia, o bar
convida ao chopp, a academia diz que ali tudo é saúde, os parques nem se fala e
os shoppings são uma maravilha: alegria pura, vitória do consumo, momentos
radiantes de futilidade, instantes de intensa, radiosa, solar e estúpida alegria.
É como se em meio à tormenta da pandemia vivêssemos a sagração da primavera.
Comemoramos em epifania nojenta a
nuvem suja e invisível que nos cerca e caminhamos contra o vento sem senso nem
sentimento, sem pudor, desrespeitosos.
Em alguma medida nos
transformamos em um grande campo de concentração ao ar livre, numa festa
desprimorosa que em alguma medida comemora a morte dos cem mil. Mas, esteja
certo e confiante: ainda é possível matar mais – basta reabrir as escolas para
dar início ao massacre dos inocentes.
Eia, pessoal! Adiante! Vamos levar
as crianças à escola. Só quero saber quem será o Herodes do Rio Grande do Norte.
As crianças podem morrer de Síndrome Inflamatória
Multissistêmica Pediátrica, que acomete crianças e adolescentes de zero a 19
anos, e que pode estar ligada à covid-19, li isso em matéria na Tribuna do
Norte há uns três dias.
Mas, fora isso é festa; o grande
campo de concentração é florido. O Brasil é um país de cores lindas e nem
precisamos de ordem de prisão para seguir em direção ao abismo: estamos de
braços dados com o fosso – amigos íntimos, irmãos, camaradas.
Pessoas morrem literalmente aos
montes, mas os demais são como passantes; imunes, levianos. Embebidos de um
deleite troncho e insensível querem diversão e fuga.
Há algo de monstruoso nessa forma
de existirmos enquanto nação. Há algo de imundo nas decisões de vivermos essa
falsa normalidade, cavilosa hipocrisia de convivermos com aquilo que pode no
matar.
Há algo de podre neste reino da
desgraça. Há algo de podre na pátria amada Brasil.
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