sexta-feira, 22 de novembro de 2019


A família pobre e sua galinha muito amada

Vi ontem uma cena de patética ternura: uma família pobre caminhava pela Roberto Freire levando consigo alguns bens modestos, certamente parte relevante do seu limitado patrimônio.

A mãe agarrava-se a um enorme e amassado pacote, o pai seguia com uma grande bolsa de lona e a filha, menininha de uns sete anos, abraçava com terna alegria uma galinha. Isso comoveu-me: a atitude da criança e seu bicho mui amado. 

Não tive outra coisa a fazer senão parar o carro e ficar observando aquela singela procissão, humilde manifestação de unidade familiar. Acima de tudo pelo fato da presença da galinha, conduzida pela criança como se fora objeto de extrema relevância ou pessoa muito querida.

Eles foram se afastando, afastando, afastando, até se tornarem toquinhos de gente perdidos nas lonjuras da grande avenida. 

Não sei qual o destino final da galinha; certamente a panela no almoço de domingo. Mas a forma como a menina a segurava, o carinho com que a tratava poderia sugerir que ela teria até mesmo a improvável chance de virar animal de estimação. Torço pela galinha.

Mas a cena trouxe também à minha retina a visão de uma típica família brasileira com seus parcos pertences, suas coisas valiosamente pobres; um nada que vale tão pouco que até uma galinha é coisa a ser levada em conta. E o pior: tudo resultado de trabalho sofrido e mal pago per omnia secula seculorum. 

Aquela família certamente jamais saberá que este repórter, velho e feio, a olhou com intensidade e atenção. E certamente seguirá seus dias vazio abraçando outras galinhas e levando pelas ruas seus surrões cheios de cacarecos e outras miudezas, tudo tão importante e tão despossuído. 

Abraços a esses três desconhecidos. Abraço ao pai e à mãe. Abraços à menininha. Abraço muito especial à galinha – que, benza Deus, vire bicho de estimação e escape da panela.  






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