sábado, 1 de fevereiro de 2014

Você sabe com quem está falando?


O meu rolezinho

Há alguns dias acompanhei minha mulher às compras; lojas do centro de Natal. Numa delas, de roupas femininas, entramos e fiquei parado nas imediações da porta enquanto ela procurava por vestidos.

Nossa atitude foi o suficiente para que um funcionário da segurança entrasse imediatamente em ação: ao que tudo parecia indicar – notei logo suas manhas – ele estava pensando algo mais ou menos assim: “Esse casal de trambiqueiros está armando algum golpe.” Mais claramente: ele começou a andar em círculos, olhos cravados em  mim.

Ia de um ponto a outro da loja tentando disfarçar sua imperícia como vigia, digamos assim, não caracterizado. Não usava arma aparente nem uniforme. Devia estar se achando o máximo. E eu, claro, seria um terrível elemento que a qualquer momento iria afanar alguma peça de roupa e sair, na companhia da minha mulher, correndo feito dois loucos pela Princesa Isabel.

Notando os olhares do indivíduo caminhei até o centro da loja e ali parei. Não toquei em nenhuma roupa, não examinei nada. Cruzei os braços e permaneci estático. Em seguida voltei para junto da porta. Com isso quis sinalizar ao elemento que eu nada queria, a não ser exercer o direito de estar num local aberto ao público.

Ele continuou a me rondar, chegando ao ponto de seguir-me quando fui em direção dos provadores de roupa acompanhando minha mulher que queria experimentar um vestido. O rapaz chegou bem perto de mim. Quase me tocou. Minha mulher não se interessou por nada e desistiu. Agradeceu às atendentes e deixamos a loja.

Saímos. La fora, rimos bastante da lamentável atitude, da bizarrice, da estupidez do vigia. Devo dizer que a situação foi constrangedora. Por instantes deu-me vontade de reagir, mesmo com serenidade, às atitudes do sujeito. Mas eu queria ver até aonde ele iria. Queria perceber até aonde iria a ação daquele ignorante.

Agi com calma até pelo seguinte: àqueles dias estava em alta a ação dos jovens que praticam rolezinhos. Na prática, resolvera dar o meu rolezinho: invadir aquele espaço onde era tido como ameaçadador. E resolvi sofrer o preconceito sem manifestar maiores repúdios. Arquei com as consequências emocionais daquela situação que oscilava entre o ridículo vigilantismo e o patético ato de alguém ser, por motivo apenas indicial, comparado a um criminoso, a um ser de periculosidade nascida de suspeita infundada.

Devo dizer: não foi fácil. É terrível você sentir-se observado, analisado, visto, examinado por um óculo torto e desfocado. Não vou entrar a fundo na questão do rolezinho: é coisa para outro artigo. Mas é lamentável, é perigoso – e até bastante perigoso – alguém ser visto previamente como “mau elemento” sem que tenha efetivamente manifestado periculosidade.

Controlei-me acima de tudo para não humilhar nem dirigir-me àquele trabalhador mal qualificado, recebedor de salário mínimo e perguntar: “Você sabe com quem está falando?”

 

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