sábado, 13 de março de 2010

Raphael Falavigna/Folha Imagem

A morte de Glauco
Emanoel Barreto

A morte do cartunista Glauco, chocante sob todos os aspectos, é o triste registro do desaparecimento de um grande cronista da realidade urbana: os minúsculos e miseráveis dramas da condição humana manifestos num casal neurótico ou num filho edipiano, a corrupção endêmica, a brutalidade na infância criminalizada, a discriminação opressora sobre os índios, a secretária solitária e libidosa, desesperada por ter visto o tempo passar e jamais ter sido escolhida.

A Folha, onde editava seus cartuns, deixou em branco todos os espaços destinados a esse tipo de material, incluindo a charge editorial. Isso, num jornal cerebral como a Folha, não é pouco. Dá para avaliar o sentimento de perda. Sentimento também manifesto em editorial que, contrariando todos os padrões desse tipo de texto, manifestou-se em um olhar pungente, bastante próximo a uma crônica.

Perdeu-se o poeta, o homem religioso, seguidor do Santo Daime. Perdeu-se, enfim, um ator político. Sim, pois suas charges e cartuns eram pronunciamentos vigorosos, perplexos, revoltados. De alguma forma, como é comum ocorrer com todos os que sentem-se ligados a alguém a quem nunca vimos, mas de cuja convivência participamos na quase interação jornalística diária, sinto que perdi um amigo que sempre me brindava com o toque magistral do seu talento.

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