quinta-feira, 10 de setembro de 2020


Sua casa é o seu país
Por Emanoel Barreto

Nestes tempos indignos e estando obrigado a ficar recolhido à minha casa descobri que é possível viver um luminoso processo de descoberta daquilo que seria apenas minha habitação, mas vira ninho. Para quem se sabe como território de si mesmo a casa tem horizontes e paisagens. Que desafiam o cotidiano repetitivo e reto e ele se transforma em viagem, caminho e repouso. 

Veja só como se faz isso: é possível reler partes de um livro antigo e muito querido, ouvir um disco que estava ocioso há anos ou simplesmente parar e escutar atentamente o silêncio. 

Ouvindo o silêncio você percebe que o som em calmaria não é completamente mudo, pelo menos nem sempre. À noite especialmente o silenciar se alicia à penumbra e até mesmo à escuridão, e você ouve e quase toca nos pequeninos barulhos que ousam sair de seu sono de simples barulhos para bater na porta dos seus ouvidos.

 É como se dissessem: “Dá licença de chegar?”

A casa inteira pulsa mansamente em calma, paz, tranquilidade; num grande bocejo da paciência boa que  é a paciência de quem não está à espera de nada e portanto pode ter a serenidade preguiçosa do olhar semicerrado. 

Quem sabe se ser não precisa se desesperar por estar em casa. Se você prestar bem atenção até o cárcere é um refúgio. Imagine a sua própria casa. Faça dela seu mar, seu porto, seu navio e sua estrada, caminho, floresta e farol - de cima desse farol você pode olhar suas mais remotas lembranças, tristezas já esquecidas, alegrias antigas que voltam para um abraço ou momentos bobos que de repente he aparecem e dizem: "E aí? Lembra daquele jogo de futebol lá no colégio?"

Não se desespere. Tudo se vai. O temo ruim vai passar. Assim, passe um pano na poeira dos temores e deixe-os todos lá fora. Caminhe em você mesmo e sinta que a impaciência pode custar caro. Ficar em casa é um abraço na vida. 

Caminhe ao lado de sua companheira e saiba que a sua casa é ao mesmo tempo escudo, certeza e paz. Fique bem.



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