quinta-feira, 30 de março de 2017



Cavilações para salvar Temer

Li, entre perplexo e com alguma náusea, o caviloso editorial do Estadão em que defende a permanência do suposto presidente Temer no cargo, apesar de tudo. 

Diz o manhoso pronunciamento do jornalão dos Mesquita:
“A decisão que se anuncia do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a cassação da chapa Dilma-Temer, eleita em 2014, será um teste de enorme importância para a maturidade institucional do País, na medida em que terá que levar em conta não apenas o conjunto probatório exposto nos autos, mas, sobretudo, num momento especialmente delicado da vida nacional, o peso político do julgamento e seus inevitáveis reflexos na atividade econômica, cuja recuperação exige a aprovação urgente de reformas pelo Congresso Nacional.”

O texto se insere à perfeição nos meandros da ideologia. Sofisma, para sermos mais exatos: dá a impressão de ser verdadeiro, mas se exaure na forma já que o conteúdo é falso. 

Ou seja: o que os Mesquita querem mesmo é que Temer continue com sua funesta jornada de retirar direitos aos trabalhadores, entregar o território nacional aos grandes grupos e assegurar ao capital rentista que continuará a obter grandes lucros – afinal, acabar com a aposentadoria tem por finalidade essencial levar gente pobre a gastar dinheiro com fundos de pensão. 

Ia esquecendo: o editorial tem o matreiro título de “Os fatos e o bom senso”, como a indicar que, da mesma forma com que se fará com o esbulho dos trabalhadores deverá valer, no caso da cassação de Temer, “o acordado sobre o legislado”. 

Faz-se um acerto, e o que valeu para cassar Dilma não vale para Temer, mesmo sendo ambos alvos de idêntica ação. 

O parágrafo seguinte busca dar sustentação à assertiva que o antecede. 

Veja só:
“A eventual cassação do mandato do presidente Michel Temer – que só se consumará, após a decisão do TSE, depois de julgado o inevitável recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF) – será seguida, no prazo de 90 dias, pela eleição de um novo chefe de Estado e de governo pelo Congresso Nacional, para um mandato-tampão de alguns meses.
“Em outubro de 2018 será eleito por voto direto um novo presidente. Isso quer dizer que o País ficaria praticamente paralisado até lá, engolfado num processo sucessório que, em vez de demonstrar a vitalidade das instituições – golpeadas que estão pelos escândalos armados pelo lulopetismo –, mostraria, isso sim, um quadro de letargia administrativa. 

“Nada de bom viria dessa manifestação de “normalidade institucional”, como se apressariam alguns adeptos do caos a denominar a crise.”
A afirmativa do jornal nada mais é do que uma tentativa de aterrorizar quem o lê ao invés de admitir que a cassação de Temer nada mais seria do que consequência punitiva do sistema de corrupção que vem sendo desvelado e que, sabemos nós, é um lodo que existe em todo o território nacional. 

O caso do Tribunal de Contas do Rio não me deixa mentir –aliás, esses ditos Tribunais deveriam passar por severa fiscalização.
Mais adiante o jornal admite que são poderosos os motivos para a cassação da chapa Dilma/Temer: 

“O ministro Herman Benjamin concluiu esta semana seu relatório sobre o caso depois de ouvir os demolidores testemunhos a respeito do envolvimento de Dilma Rousseff e de Michel Temer na negociação de doações para a campanha de 2014.”

Se os argumentos são “demolidores”, vamos demolir. Depois, que venha a reconstrução, inclusive moral, dos mandatários.  

Diz afinal o Estadão: 

“Em entrevista publicada no Estado no dia 23 último, o ministro Benjamin sinalizou, de fato, seu voto pela condenação, ao afirmar que não aceita que o “argumento poderoso dos fatos seja derrotado por fundamentos que não têm sustentação, exceto no jogo do poder”. Não obstante, segundo depoimentos de cinco ministros do TSE colhidos pela reportagem do jornal em Brasília, será necessário, no julgamento dessa ação, levar em consideração a estabilidade política do País. Que assim seja.”

Insurgir-se ante o anunciado voto do ministro Benjamin é manobra política; malandragem ideológica e sofisma para tentar manter no poder uma determinada situação, assegurar a certos estamentos que terão tranquilidade para continuar, impunes e fagueiros, a praticar o que tão bem sabem fazer.

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