“Sabe falar espanhol?”
Este Dia do Jornalismo me levou
longe, confins de 1974; agosto, mais precisamente, quando fui ao Diário de
Natal pedir emprego a Luis Maria Alves. Tive um estalo e decidi: “Vou ao jornal.”
Era coisa de oito da noite. Quando cheguei, Seu Alves estava com visitas. O vigilante
pediu para eu esperar. Não tive paciência e saí. Dez minutos depois, empurrado
pela vontade de trabalhar em jornal, voltei. Voltei e esperei.
Enquanto aguardava, vi quando o
jornalista Cassiano Arruda saía da redação na companhia de um grupo de
jornalistas e radialistas da Poti. Brincando, ele falava com o radialista
Batista da Fonseca: – Batista da Fonseca, uma perna é fina e a outra é quase.
Pouco depois Seu Alves também
aparecia. Acompanhava os visitantes à porta do jornal. Nervoso, quase caio
quando o vigilante, apontando para mim, disse: – Aquele menino quer falar com o
senhor.
Eu tinha 23 anos e nunca havia
trabalhado em nada. O velho virou-se para mim e disse: – Vamos entrar.
Pela primeira vez eu pisava no
solo sagrado de uma redação. Birôs por toda parte, ventiladores pendiam do
teto. Ao fundo, a impressora. Grande, pesada, assistia a tudo cercada por
enormes bobinas de papel. Seu Alves foi direto ao ponto: – Sabe falar espanhol?
Percebi que, aparentemente,
havia me metido numa enrascada. Mas respondi com firmeza: – Falar não falo, mas
consigo ler sem problema.
Ele disse: – Ótimo. Mas, o
grande problema é que hoje se exige registro de jornalista no Ministério do
Trabalho. Isso prejudica muito e impede que jovens talentos venham trabalhar no
jornal.
O registro era uma forma de a
ditadura mapear quem era jornalista, formado ou não, e saber onde estava
trabalhando. Mas, voltemos. Seu Alves disse que, caso eu ficasse, iria
trabalhar a partir da meia noite até seis da manhã, traduzindo telegramas que
vinham da UPI e France Presse. É que à meia noite as representações brasileiras
deixavam de traduzir os telegramas e Seu Alves queria que, de manhã, eles já
estivessem, em português, prontos para ser editados.
Topei no ato. Ele mandou que
dois dias depois eu voltasse ao jornal para um teste. Voltei no prazo marcado e
o teste foi o seguinte: ele ditou-me trecho do livro “Os mortos são
estrangeiros”, de Newton Navarro, escritor, poeta, cronista, pintor maior.
Queria mensurar minha rapidez
em datilografar e ver se cometia erros, se escrevia palavras erradas. Depois,
um teste para ver meu nível de informação. Terminava a prova, ele sentenciou: –
Você é alfabetizado.
Começava aí minha vida em
jornal. Dias depois eu entrava para a equipe do Diário, mas não como tradutor
de telegramas. Passei e integrar a equipe de repórteres policiais, ao lado de
Pepe dos Santos e Alexis Gurgel, além do fotógrafo Paulo Saulo.
De lá até hoje se passaram, com
a velocidade da vertigem, 39 anos. Bem vividos, bem lutados. E continuo a gostar
de ler em espanhol.
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