domingo, 7 de abril de 2013



“Sabe falar espanhol?”

Este Dia do Jornalismo me levou longe, confins de 1974; agosto, mais precisamente, quando fui ao Diário de Natal pedir emprego a Luis Maria Alves. Tive um estalo e decidi: “Vou ao jornal.” Era coisa de oito da noite. Quando cheguei, Seu Alves estava com visitas. O vigilante pediu para eu esperar. Não tive paciência e saí. Dez minutos depois, empurrado pela vontade de trabalhar em jornal, voltei. Voltei e esperei.
Enquanto aguardava, vi quando o jornalista Cassiano Arruda saía da redação na companhia de um grupo de jornalistas e radialistas da Poti. Brincando, ele falava com o radialista Batista da Fonseca: – Batista da Fonseca, uma perna é fina e a outra é quase.

Pouco depois Seu Alves também aparecia. Acompanhava os visitantes à porta do jornal. Nervoso, quase caio quando o vigilante, apontando para mim, disse: – Aquele menino quer falar com o senhor.

Eu tinha 23 anos e nunca havia trabalhado em nada. O velho virou-se para mim e disse: – Vamos entrar. 

Pela primeira vez eu pisava no solo sagrado de uma redação. Birôs por toda parte, ventiladores pendiam do teto. Ao fundo, a impressora. Grande, pesada, assistia a tudo cercada por enormes bobinas de papel. Seu Alves foi direto ao ponto: – Sabe falar espanhol?
Percebi que, aparentemente, havia me metido numa enrascada. Mas respondi com firmeza: – Falar não falo, mas consigo ler sem problema. 

Ele disse: – Ótimo. Mas, o grande problema é que hoje se exige registro de jornalista no Ministério do Trabalho. Isso prejudica muito e impede que jovens talentos venham trabalhar no jornal.

O registro era uma forma de a ditadura mapear quem era jornalista, formado ou não, e saber onde estava trabalhando. Mas, voltemos. Seu Alves disse que, caso eu ficasse, iria trabalhar a partir da meia noite até seis da manhã, traduzindo telegramas que vinham da UPI e France Presse. É que à meia noite as representações brasileiras deixavam de traduzir os telegramas e Seu Alves queria que, de manhã, eles já estivessem, em português, prontos para ser editados.

Topei no ato. Ele mandou que dois dias depois eu voltasse ao jornal para um teste. Voltei no prazo marcado e o teste foi o seguinte: ele ditou-me trecho do livro “Os mortos são estrangeiros”, de Newton Navarro, escritor, poeta, cronista, pintor maior.
Queria mensurar minha rapidez em datilografar e ver se cometia erros, se escrevia palavras erradas. Depois, um teste para ver meu nível de informação. Terminava a prova, ele sentenciou: – Você é alfabetizado. 

Começava aí minha vida em jornal. Dias depois eu entrava para a equipe do Diário, mas não como tradutor de telegramas. Passei e integrar a equipe de repórteres policiais, ao lado de Pepe dos Santos e Alexis Gurgel, além do fotógrafo Paulo Saulo.
De lá até hoje se passaram, com a velocidade da vertigem, 39 anos. Bem vividos, bem lutados. E continuo a gostar de ler em espanhol.

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