sábado, 2 de julho de 2011

Cherchez la femme

Leio na Folha e, abaixo, comento.

Ex-diretor do FMI é solto após reviravolta

Segundo Procuradoria, camareira mentiu sobre os detalhes de suposto ataque sexual de Dominique Strauss-Kahn
Acusações contra ele não foram totalmente retiradas, porém; caso pode ter impacto sobre a eleição francesa
Don Emmert/France Presse

Ao lado da mulher, Anne Sinclair, Strauss Kahn sai da Suprema Corte em liberdade, sem pagar fiança e sem tornozeleira de monitoramento eletrônico

ÁLVARO FAGUNDES
DE NOVA YORK

O ex-diretor-gerente do FMI Dominique Strauss-Kahn, acusado de atacar sexualmente uma camareira de hotel em Nova York, foi liberado da prisão domiciliar, devido a dúvidas sobre a credibilidade da suposta vítima.
Ele removeu a tornozeleira eletrônica e terá de volta US$ 6 milhões pagos de fiança (incluindo US$ 5 milhões depositados em garantia).

As acusações ainda não foram retiradas, contudo, e ele não pode deixar os EUA, uma vez que seu passaporte está retido. Ele volta a se apresentar à Justiça em 18 de julho.
Caso seja inocentado, pode provocar uma reviravolta na disputa presidencial francesa, no ano que vem. Strauss-Kahn é uma das principais figuras do Partido Socialista, de oposição.
Os procuradores continuam a afirmar que acreditam que o ex-diretor do FMI atacou a camareira, mulher de 32 anos vinda da Guiné (oeste da África).

Mas admitem que as contradições apresentadas nos depoimentos podem tornar difícil para os jurados considerar o francês culpado.

"A força do caso foi afetada por questões de credibilidade", disse a procuradora Joan Illuzzi-Orbon.

A mudança ocorreu depois que a Procuradoria afirmou que a camareira mentiu não só sobre detalhes que ocorreram após o suposto ataque, em 14 de maio, como também sobre seu passado.

Em depoimentos anteriores, ela tinha afirmado que, após sair do quarto de Strauss-Kahn, ficou no corredor do andar até a saída do francês, para então reclamar com seu chefe.
Depois, porém, ela teria mudado a versão, dizendo que, antes de falar com seu chefe, limpou um quarto próximo ao do ex-diretor-gerente do FMI e também o dele.

Além disso, segundo a Procuradoria, a camareira admitiu ter mentido em seu pedido de asilo nos EUA e sobre ter sido vítima de um estupro grupal em seu país de origem.
A camareira também teria mentido ao colocar como dependente no Imposto de Renda o filho de um amigo para receber restituição maior.

Segundo o advogado dela, Kenneth Thompson, a camareira "cometeu alguns erros", mas "não significa que ela não seja vítima de estupro". "A única defesa de Dominique Strauss-Kahn é que o encontro sexual entre os dois foi consensual. Isso é uma mentira."

Strauss-Kahn esteve ontem no tribunal em Nova York acompanhado da mulher, Anne Sinclair. Os dois saíram lado a lado e sorrindo.

ELEIÇÃO
Uma possível absolvição de Strauss-Kahn pode mudar o panorama da eleição presidencial francesa do ano que vem, em que ele aparecia como favorito antes da prisão.
Membros do seu partido, o Socialista, já pediram para que o processo das primárias internas seja adiado, para dar mais tempo ao ex-diretor do FMI de concorrer.
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Tenho a impressão de que trata-se, aí, de caso claro e clássico de abuso de poder, social, sexual e econômico. Mulher - pobre e trabalhadora - é ultrajada na intimidade alugada de um quarto de hotel, mas comete o crime de ter como agente ativo desse ultraje figurão da política francesa. Então, de repente, após o impacto inicial do escândalo, começam a ser destampadas culpas sociais da mulher. Pronto: a agressão, o abuso, o domínio do macho rico e poderoso sobre a fêmea trabalhadora suplantam seu assédio. E ela tem culpa de ser fêmea e desejada. Sculenta presa do tigre poderoso. Como deixar passar a oportunidade de sexo rapidinho sobre mulher à qual se atribuiu volúpia e desejo?

Mas, as cartas estão na mesa. O figurão pose ao lado da esposa bonitona, que apoia o marido.
Como contestar a família perfeita? Se a mulher-esposa aceitou as desculpas, como pode a sociedade contrariar tão sagrada circunstância? Não pode. Claro que não. E assim, o homem surge como elemento divinizado, o pai, o esposo que, de repente, foi cercado pela insídia de mulher vulgar e camareira.



É isso: não se sabe exatamente o que ocorre nas coxias dessa peça trágica. A vítima foi comprada para se assumir culpada? Houve consenso no ato banal do sexo hoteleiro? O bom senso diz que não. Mas, para a assessoria do figurão lúbrico, tudo pode ser legalizado e quem sofreu passa a ser agressora. Depois, o tempo passa e ele pode até ser eleito presidente da
França.






 

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