Na sociedade de consumo, dependendo do lucro que possa dar, até mesmo comportamentos de grupos marginais podem ser absorvidos/absolvidos e enfeixados em grifes e fama decorativa, passageira, volátil, e com alguma lucratividade.
É o caso da marca Daspu, criada pela ONG Davida, que reúne prostitutas com o objetivo de criar uma consciência de grupo, um sentimento de pertença e de auto-estima através da moda, roupas inspiradas nas peças que as mulheres usam quando estão, como dizem elas, na batalha. A intenção é boa e já começa a ser estudada pelo sistema de lucro, esquadrinhando o mercado. Se der, deu...
Noite passada, em paralelo à Fashion Rio, a marca Daspu promoveu desfile de prostitutas e travestis numa livraria e um bom público aplaudiu. Aplaudiu,certamente, o inusitado. Afinal, pessoas bem-pensantes, gente cabeça, jamais iria negar umas palminhas às moças. É de bom-tom, politicamente correto, atirar aplausos às causas dos desvalidos, gauches e assemelhados.
Mas, daí até à aquisição de alguma roupa provinda da marca, suponho que haja uma grande distância. Rapazes e moças de classe média, é verdade, usam calças jeans que vêm de fábrica "rasgadas" ou "desbotadas", para dar a falsa impressão de roupas velhas, utilizadas por um usuário despojado. Há um certo ar falsificado de casualidade blasé, uma impostação comprtamental.
Mas entre a moda blasé e a moda Daspu vai uma distância abissal. A primeira reafirma as condições de classe, o poder econômico charmoso de pessoas que podem esbanjar dinheiro - essas roupas são caríssimas; a segunda afirma uma posição, uma situação sócio-econômico-grupal marginalizada. Assim, migrar de uma roupa de grife internacional para uma marca brasileira e ainda por cima criada por prostitutas, teria o significado de adesão a uma causa, engajamento e... pertencimento. Não creio que haja tal possibilidade.
As intenções da ONG são boas, mas há um impeditivo social a demarcar territórios e grupos. A fronteira é invisível, mas mantém - é isso mesmo - cada um em seu lugar.
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