domingo, 25 de janeiro de 2015

Belíssima reflexão sobre o momento fotográfico: um presente que me envia o amigo Pedro Jales





A foto como instante, irrepetível ato

Por Pedro Jales

Emanoel Barreto: "Sépalas"
A fotografia lida com o instante. É o momento escrito em luzes, cores e, sombras. Ela capta o instante, o fugaz, logo, seu objeto estético é o tempo. A combinação  de luz, sombra e formas capturam uma fatia, única, da tessitura do tempo.

Ao compararmos os  objetos da escultura e da arquitetura,  a teoria nos  ensina que a primeira lida com  o volume, enquanto na segunda o objeto é o espaço. Levando a comparação para a pintura versus fotografia, percebe-se que o pitoresco não é o objeto estético da fotografia;  a fotografia pode até agenciar a apreensão do pitoresco dispondo-a para a pintura, mas só de passagem.

Na fotografia o trabalho, a manipulação sobre o  objeto se dá numa margem muito estreita, ferindo o limite do escopo da pintura, mesmo que seja uma pintura expressa em  pixels. 

Logo, não existe “criação”, ou melhor, o processo completo entre a inspiração, a apreensão do objeto, e a consecução, é instantâneo, estampando a emoção diretamente do nível subjetivo. O lapso entre a percepção e a captura é crítico, pois uma foto muito estudada invade o objeto estético do retratista, do escopo da pintura, portanto. Quanto mais se demora estudando luzes, ângulos e enquadramentos, mais  se invade o âmbito da pintura. Logo, quanto menos interferência técnica, quanto mais automática a câmara, quando mais instantânea a foto, mais pura a obra. No limite, a qualidade técnica fica a cargo dos técnicos que constroem a câmara.

Dizer que a manipulação digital matou a fotografia, me parece um equívoco: a manipulação digital expandiu as fronteiras da pintura, do trabalho com cores continuando e ampliando a inspiração, do laborar, do desbastar e polir, do construir experiencial sobre o objeto estético. Criou novos métodos e técnicas. Porém, as técnicas construtivas da fotografia digital, a tecnologia tornada acessível, também ampliaram, e ainda vem muito por aí, enormemente as possibilidades da fotografia. Vide por exemplo, as fantásticas nova fotografias esportivas, que reproduzem instantes muito mais curtos, antes inimagináveis, ou dificílimos de se captar.

A fotografia como linguagem estética, é impressionista. Quando deixa de sê-lo, passa a ser pintura. É de fora para dentro, projetando uma disposição para o estético, uma entrega, uma permanente atenção ao mundo e ao tempo, com seu fluir e sua tessitura,  enquanto objeto estético. A experiência estética é subconsciente; não há a interpretação criativa, não  há necessidade do experienciar emotivo para produzir a obra. É o “olhar fotográfico”.

A experiência se desperta num nível profundo, e se projeta no objeto fotografado. Ela dribla e escamoteia a emoção vivenciada, observável, pois o momento produz uma semente de emoção, própria do tempo, das condições temporárias locais, que transcende o conjunto emocional diretor do  comportamento e das sensações. 

A fotografia da bailarina não é a dança. A fotografia da expressão do ator não é a sua emoção. A fotografia precisa de um quadro famoso não é a pintura. A fotografia do animal em movimento não é o movimento do animal, e assim, cada objeto estético se abriga em sua própria arte, restando à fotografia apenas o instante.

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